"O governo brasileiro, na atuação contra a guerrilha do Araguaia, violou os direitos humanos, praticou torturas e homicĂdios, sendo condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por tais fatos", sustenta o governo federal, em nota que a Secretaria de Comunicação Social (Secom) da PresidĂȘncia da RepĂșblica divulgou nas mĂdias sociais hoje.
Na nota, o governo federal acusa a gestão anterior de "desinformar" a população sobre "eventos históricos de amplo conhecimento" e de tratar como "honroso o momento mais repulsivo da história recente do paĂs" ao tratar como herói "o homem que ordenou a prisão, tortura e execução de cidadãos brasileiros que defendiam a democracia durante o regime militar, em especial os que atuaram na guerrilha do Araguaia, na região de Tocantins, ParĂĄ e Maranhão".
Justiça
"A Secom retifica a divulgação ilegal que fez sobre o tema, em respeito ao direito à verdade e à memória", afirma a secretaria, acrescentando que "nada justifica a tortura, a mais covarde das violĂȘncias".
A publicação do texto cumpre uma decisão da 8ÂȘ Vara CĂvel Federal de São Paulo, que concedeu direito de resposta a parentes de pessoas mortas ou violentadas por agentes pĂșblicos comandados pelo Major Curió, que faleceu no ano passado, com 87 anos de idade. À época, Curió jĂĄ tinha passado para a reserva na condição de coronel e o governo federal jĂĄ havia atendido a vĂĄrios pedidos de anistia de vĂtimas da repressão militar, admitindo as violações aos direitos humanos.
A ação judicial que resultou no direito de resposta foi motivada por uma publicação veiculada nas mĂdias sociais oficiais do governo federal em 5 de maio de 2020, durante a gestão do ex-presidente da RepĂșblica Jair Bolsonaro. Na ocasião, a Secom, então chefiada por Fabio Wajngarten, divulgou um texto em que classificava Curió como herói por ter "combatido a guerrilha comunista no Araguaia". O texto era ilustrado por uma foto do encontro de Curió com o presidente Bolsonaro, ocorrido na véspera (4), no PalĂĄcio do Planalto.
Homenagem
O fato de Bolsonaro receber Curió em seu gabinete e de usar a mĂĄquina estatal para elogiar a atuação do militar causou a indignação e a revolta de familiares das vĂtimas da ação do ex-major, que obtiveram, na Justiça, o direito de resposta não concedido pelo governo Bolsonaro, que recorreu da decisão. Segundo a Secom, com a mudança de gestão, no inĂcio deste ano, o governo federal se pôs em "total concordância com a ordem judicial que determinou o restabelecimento da verdade".
O próprio Curió admitiu, em 2009, em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo, que as forças sob seu comando torturaram e executaram 41 guerrilheiros, alguns deles rendidos após se entregarem às forças de segurança. Dois anos depois, ele chegou a ser detido durante uma operação de busca e apreensão de documentos que pudessem revelar o paradeiro de corpos de guerrilheiros desaparecidos durante a Guerrilha do Araguaia.
Ao longo dos Ășltimos anos, o Ministério PĂșblico Federal (MPF) apresentou ao menos trĂȘs denĂșncias contra Curió, acusando-o por crimes cometidos durante a ditadura militar, como sequestros, homicĂdios, ocultação de cadĂĄveres e tortura.
A reportagem procurou o ex-chefe da Secom, FĂĄbio Wajngarten, e aguarda posicionamento.
*Colaborou Andreia Verdélio